Lei derrotada pelos desmanches
31/03/2009
 Por
trás da fachada de um cyber café desativado ou através de uma passagem
secreta dentro de uma garagem pode estar camuflado um desmanche ilegal,
crime que ganha cada vez mais força e não consegue ser contido por uma
lei engavetada há quase dois anos. Sem tornar viável a legislação
criada para deter a indústria criminosa das peças de carros roubados ou
furtados, o governo do Estado projeta largar o problema no colo das
prefeituras.
Em gestação pelo governo, uma nova regulamentação
da lei está sendo elaborada para repassar aos municípios o controle e a
fiscalização sobre a compra e a venda das peças. Os prefeitos teriam de
colocar à disposição suas estruturas para monitorar a venda, além de
criar legislações locais para tornar mais rigoroso o controle sobre o
comércio de autopeças usadas.
– Foram feitas inúmeras reuniões
com o governo, mas só encontramos muita embromação e falta de vontade.
Agora, querem jogar para o município uma responsabilidade que deveria
ser da Brigada e da Polícia Civil – lamenta o autor da lei, o deputado
estadual Adroaldo Loureiro (PDT).
Com
a nova regulamentação, o governo tira de suas costas o principal
obstáculo da lei: a fiscalização sobre o comércio de peças. Mas delega
essa tarefa aos prefeitos. A Federação das Associações de Municípios do
Rio Grande do Sul (Famurs) não se opôs à ideia, mas fez ressalvas.
–
Não dá para os municípios fazerem o serviço sozinho, precisaremos de
uma parceria dos órgãos do Estado. A proposta que está sendo estudada
prevê essa condição e, por isso, nós apoiamos. Achamos que o maior
controle aumentará a arrecadação de impostos, viabilizando os
investimentos necessários – afirma o coordenador da área de Trânsito da
Famurs, Sérgio Peretto.
O governo, no entanto, não encontrou
alternativa para fazer o controle de cada peça vendida, fundamental
para o funcionamento da lei. O delegado de Furtos e Roubos de Veículos,
Heliomar Athaydes Franco, critica o fato de a lei exigir etiquetas nos
produtos.
– Não tem como etiquetar parafuso por parafuso. Nem
no primeiro mundo se consegue isso. A lei como está é totalmente
inviável. O controle das empresas já é um passo importante, mas
precisamos avançar mais – destaca.
O
tenente-coronel Florivaldo Pereira, comandante do 20° Batalhão de
Polícia Militar e responsável pela área com maior número de desmanches
na Capital (a Zona Norte), acredita que, sem um controle rigoroso sobre
as peças, a lei é inócua.
– Os donos de ferros-velhos ilegais
compram os carros batidos em leilões e vendem peças de veículos
roubados. O carro comprado serve só para esquentar os produtos que eles
comercializam. Tem de ter controle disso, do contrário o nosso trabalho
não adianta para quase nada – lamenta o oficial, chefe da guarnição da
BM que localizou no final de semana o desmanche de carros oculto sob a
fachada de um cyber café na Avenida Assis Brasil.
Duas pessoas foram presas e seis carcaças de carros roubados foram identificadas no local.
Zero Hora tentou contato com a
chefia da Casa Civil, responsável pela coordenação dos trabalhos envolvendo a Lei dos Desmanches, mas não obteve retorno.
gustavo.azevedo@zerohora.com.br GUSTAVO AZEVEDO Mudanças propostas | Ao
mesmo tempo em que não colocou a lei em prática, governo do Estado
tenta transferir aos municípios a fiscalização dos desmanches: | Como deveria ser | Um
sistema online ligaria as autopeças ao Detran, que gerenciaria e
controlaria o banco de dados com informações sobre peças de veículos | A
empresa deveria etiquetar com código de barras as peças a serem
revendidas e manter um catálogo com a localização dos produtos nas
prateleiras, como se fosse um supermercado | As polícias Civil e Militar seriam responsáveis pela fiscalização da venda de peças | Ao
vender uma peça, a empresa emitiria um nota fiscal, contendo o número
de chassi do carro de origem, assim como o registro de baixa e dados
pessoais do comprador. A venda seria registra no sistema do Detran | Banco | de dados | Cadastro | das peças | Fiscalização | Venda | Como pode ficar | O
sistema de controle das peças não existirá mais. Os municípios
gerenciariam um outro cadastro em conjunto com o Detran, que
catalogaria as empresas | O novo
texto não especifica a forma como o cadastro será feito. Diz apenas que
os itens deverão ser identificados e colocados em prateleiras numeradas | Os municípios passam a ser os principais fiscais, contando apenas com o apoio da Brigada Militar e da Polícia Civil | A emissão da nota permanecerá, mas sem o sistema. A regulamentação em gestação não prevê como controlar a venda |
Porque a lei
fracassa | VONTADE POLÍTICA | O que falta para a legislação sair do papel: | A
Lei dos Desmanches foi sancionada pela governadora Yeda Crusius em
julho de 2007. Em outubro do mesmo ano, foi assinada sua
regulamentação. Quase dois anos depois, porém, nada foi colocado em
prática. Grupos de trabalho, reuniões e encontros feitos para colocar
as regras em funcionamento não saíram da estaca zero. A pouca
participação de representantes do governo com voz de decisão contribui
para que a lei patine | Como acelerar – A maior participação de secretários e da própria governadora poderiam acelerar processos | ESTRUTURA | Para
fazer o controle e a fiscalização da venda de peças é necessária a
mobilização de uma grande infraestrutura, com a contratação de pessoal
e a elaboração de sistemas de banco de dados e de controle de baixa de
veículos. O Estado precisaria investir pesado | Como
acelerar – Parcerias com municípios, sob a coordenação de um órgão
estadual, poderiam diminuir os custos e possibilitar o controle dos
desmanches | FISCALIZAÇÃO EFICIENTE | A
indefinição de qual órgão ficaria responsável pela fiscalização é um
dos grandes entraves. O Detran diz que não tem pessoal suficiente para
isso, assim como as polícias Civil e Militar. A maioria dos municípios
não tem condições de assumir o serviço | Como
acelerar – O uso das estruturas do Estado e dos municípios
simultaneamente aparece como a solução mais clara. Os fiscais da
prefeitura trabalhariam ao lado de policiais e também agentes da
receita estadual para controlar os estabelecimentos |
Pontos polêmicos da lei atual | Controle
de estoque – O desmanche manterá um fichário com fotos tiradas no local
e na data da compra do veículo e documentos que comprovem a procedência
do carro. A documentação deverá ficar arquivada por cinco anos | Sobras – As sobras da desmontagem do carro sem aproveitamento para a venda terão que ser descartadas em 30 dias |
(Fonte: Zero Hora)
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